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segunda-feira, fevereiro 07, 2005

 

O Padre Loreno

O Reverendo Padre Loreno, no púlpito da lisboeta igreja de São João de Brito, deu claras indicações de voto ao seu rebanho e aos fieis que, pela Antena 1, seguiam o dominical rito.

Tal é o exercício de um direito que lhe assiste uma vez que como cidadão da Republica (espero que o senhor não seja um emigrante, caso em que acho um bocado abusivo) ele tem o direito, direi mais o dever, de expressar as suas opiniões e de se bater por aquilo em que acredita. Direito e dever esse que se acentuam em período eleitoral.

A Igreja Católica Portuguesa, alicerce primordial e primário de uma parte da Direita nacional sente-se particularmente atacada por algumas dessas medidas que, antecipadamente e num interessante processo de intenções está já a imputar ao futuro Governo PS. É pois natural que, como força politica que é, a Igreja Católica venha a terreiro (directa ou indirectamente) para se associar à ofensiva conservadora e de Direita que atravessa a nossa campanha eleitoral.

É nesse quadro que devem ser vistas as recentes declarações do referido padre, a nota episcopal do Patriarca, a transmissão televisiva de Santana Lopes na missa (logo em Dezembro no inicio da pré-campanha), a crónica de um destacado intelectual católico – o Professor João César das Neves – no DN de hoje, e outros exemplos haveria se procurasse mais alguns minutos na minha memoria e nos media dos últimos meses.

Estão a fazer politica, como é seu direito e dever, como entidades politicas que individual e colectivamente são.

Resta responder a duas questões:

É obvio que é legitimo o exercício dos direitos de cidadania e de expressão. São direitos inalienáveis e que não podem ser retirados a ninguém. Em Republica não há cidadãos de primeira e de segunda e os direitos são iguais para o Eng. José Sócrates, para o Dr. Santana Lopes e para qualquer outro cidadão quer vista a sotaina quer não. Qualquer deles utiliza os púlpitos que tem para fazer apelos ao voto nos partidos em que milita e em que acredita. A Igreja sempre deu indicação de voto, normalmente expressa através de notas pastorais em que diz mais ou menos a mesma coisa que o Senhor Padre Loreno disse. Até aqui tudo normal. O que há muito tempo que não se via era utilizar o púlpito, durante a Eucaristia, para exortações de ordem politica. O espaço da celebração da Eucaristia tem sido, nos últimos anos, reservado pela Igreja para a sua acção mística, para a celebração dos mistérios da sua Fé e, quando a urbi et orbi aí têm encontrado lugar tem sido para condenar o excesso de materialismo e para apelar a uma maior fraternidade entre todos os Homens. Há muito tempo que não se via apelos do púlpito ao voto neste ou naquele partido. Ou ao não voto neste ou naquele partido. E, como pelo lugar e no tempo em que é feito, pode originar uma confusão entre o que é entendido como sagrado (a celebração eucarística e, para os crentes, o milagre da transubstanciação) com o que é do politico e profano (o apelo ao voto aqui ou ali) é ilegítimo. É abuso de confiança e abuso de autoridade.

Quanto à necessidade, a Igreja parece esquecer que o Partido Socialista português é o mais clerical de todos os que existem na Europa. Que se prepara para apoiar um membro confesso do Opus Dei à Presidência da Republica – Antonio Guterres. Que foi um Governo socialista que preparou esta Concordata que tão favorável à Igreja é. Que é o PS que dá lugares de deputados a militantes católicos de gropúsculos sem representatividade e sem base social de apoio. Que o PS se manteve fora do debate sobre as referencias cristãs no Preambulo da Constituição Europeia. Que o “avental” foi arremessado (aberta ou veladamente) a João Soares, durante a campanha interna para Secretário Geral como se de uma vergonha se tratasse. Que, em resumo, do PS (deste PS) a Igreja Católica não tem nada a temer. Abertamente o digo, para mal dos meus pecados e arrepio das minhas crenças. Portanto necessário não me parece que seja, mas na duvida, não fica mal tentar condicionar o voto para portas que lhes parecem mais seguros e mais próximos da sua visão do Mundo. Se nada há a temer do PS, menos há a temer do CDS/PP que envia fragatas contra o barco da “Women on waves”.

Não sendo necessário nem legitimo é de criticar. Mas sendo o exercício do inatacável direito da liberdade de expressão, não é de impedir. À luz de uma lógica de poder politico que anima, como sempre animou, todas as grandes instituições humanas, é perfeitamente compreensível. E, na medida em que traz alguma clarificação ao debate, desejável.


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